Maria Luísa Baptistata-se devidamente ao interlocutor citadino. Os nomes das personagenssão aliás cuidadamente escolhidos e ajustam-se ao respectivo habitat.O léxico, mas também a sintaxe, os traços arcaizantes de um estádiode língua ultrapassado (por referência ao português europeu), e bem assima frequente referência a um adagiário típico, e extra-linguisticamente,o conhecimento íntimo da vida rural são meios confluentes ao serviçoda representação da referencialidade do espaço e suas inevitáveis conexõescom as categorias personagem e tempo.Sobre um cenário que remete para a referencialidade geográfica (espaçofísico), ergueu-se a acção verosímil das personagens numa organizaçãogregária dinâmica (espaço social), organização cuja perspectiva éampliada espácio-temporalmente até domínios virtuais do psiquismo eda afectividade (lato sensu). O espaço psicológico completa, portanto, arepresentação do espaço como categoria da narrativa.Na análise a que acabámos de proceder, tentámos ilustrar as nossasconsiderações com casos ocorrentes, a título exemplificativo, e não como objectivo de referência exaustiva.5. DO TEMPO5.1. Do tempo da diegese134Se FVL recria ficcionalmente por meios estéticos o real geográficocaboverdiano e, de algum modo, o social, não acontece o mesmo com oreal histórico ou político: não há, em FVL, esteios extradiegéticos em quea narrativa se firme (45) , do ponto de vista do tempo. É que a referênciaa um ano, a uma data precisa, revela-se irrelevante: o vento leste sopraciclicamente e o que a sua ‘fábula’ narra é todas as vezes tragicamenteidêntico. FVL é, nesta óptica, uma narrativa atemporal.Como qualquer outro elemento da construção romanesca, o tempoé, todavia, autónomo relativamente à referencialidade a que reporta. Asarticulações, por vezes estreitas, estabelecem-se intemamente com outrascategorias narrativas, como o espaço, a personagem, a acção. RelembremosBakhtine, 5.3., nota 38.E-book CEAUP 2007
Vertentes da insularidade na novelística de Manuel LopesJá referimos atrás, em 5.1.1., p. 76, ser possível «considerar o tempocomo instância una, visto que a acção de FVL coincide com o ciclo doflagelo, desde o seu dealbar ao seu ocaso, passando pelo vértice do clímaxtrágico».As balizas temporais de FVL inscrevem-se em Setembro, termo a quo,e possivelmente em Abril — possivelmente em Maio (49) , termo ad quem.Decorrem, assim, cerca de oito/nove meses, âmbito paradoxal da gestaçãodo aniquilamento. Já atrás (5.1.1.) referimos a marcação pendular dos meses,um a um, de Setembro a Fevereiro, durante a «Primeira parte» do romance.É que entretanto era a expectativa e a implícita esperança que iamdominando os homens, sempre crentes (apesar do agravamento sensível,paulatinamente implacável, da situação atmosférica) de que uma decisivaviragem poderia acontecer a todo o momento. Nesta «Primeira parte» é,com efeito, difícil isolar ocorrências e por isso dizíamos (5.2., p. 88): «Oque ocorre, o que avança, principalmente na «Primeira parte» de FVL, é apassagem do tempo, [...]». Deste modo, o tempo quase assume o volumede uma outra, virtual, personagem, unindo, conferindo uma significaçãoaos ‘mosaicos’ que se vão justapondo. Depois, «peripécia» e «reconhecimento»tão próximos (na boa lição da tragédia, segundo a Poética aristotélica)(50) , tão iniludíveis, são imediatamente seguidos da «catástrofe» quese instala em Novembro (ainda na «Primeira parte»). Com a catástrofe, anecessidade de sucessivas adaptações dos homens às carências crescentes.A passagem do tempo em tais circunstâncias modifica o comportamentoindividual. O que são, por exemplo, Leandro e Libânia se não aquilo a quea extrema carência os obrigou a ser? Maria Alice, a professora, comentarápara a irmã, na segunda carta que lhe dirige: «Homem na falta é diferentede homem na fartura. Não quero confundir o primeiro com o segundo,porque cheguei à conclusão de que um esquece o que o outro foi» (p. 130).Esta afirmação é já, de resto, a reiteração de uma ideia expressa na cartaanterior: «Como a fome torna os homens tão maus! E tão bonzinhos quetodos eles são quando Deus manda a chuva do céu!» (p. 121). Assim sendo,o tempo é personagem virtual e entidade modeladora dos humanos.Molda-se daí em diante um tempo colectivo quase estático (se assimse pode dizer), no sentido em que quase já não se esperam hipóteses demelhoria. Com o tempo parado, petrificam-se os humanos, isto é, inver-1352007 E-BOOK CEAUP
- Page 5 and 6:
VERTENTES DA INSULARIDADE NANOVELÍ
- Page 7 and 8:
ÍNDICEApresentação 9Nota prévi
- Page 9:
Concorri ao Mestrado de Literaturas
- Page 12 and 13:
Maria Luísa BaptistaNOTA PRÉVIAPa
- Page 14 and 15:
Maria Luísa Baptista14go, pude con
- Page 16 and 17:
Maria Luísa Baptista02.MANUEL LOPE
- Page 18 and 19:
Maria Luísa Baptista18seus número
- Page 20 and 21:
Maria Luísa Baptistapara os meteor
- Page 22 and 23:
Maria Luísa Baptistae sofrendo um
- Page 24 and 25:
Maria Luísa Baptista24para a franc
- Page 26 and 27:
Maria Luísa Baptista26A relativa p
- Page 28 and 29:
Maria Luísa Baptistade contextuali
- Page 30 and 31:
Maria Luísa Baptista1. DA ACÇÃO3
- Page 32 and 33:
Maria Luísa Baptistamo entre quere
- Page 34 and 35:
Maria Luísa Baptista34A partir da
- Page 36 and 37:
Maria Luísa Baptista36títulos apo
- Page 38 and 39:
Maria Luísa Baptistaremos a afirma
- Page 40 and 41:
Maria Luísa Baptista40Notemos que
- Page 42 and 43:
Maria Luísa Baptistasilenciaram. C
- Page 44 and 45:
Maria Luísa Baptista44distintivos
- Page 46 and 47:
Maria Luísa Baptista46insuficiente
- Page 48 and 49:
Maria Luísa Baptista48(CB, p. 57).
- Page 50 and 51:
Maria Luísa BaptistaA despeito dis
- Page 52 and 53:
Maria Luísa Baptista52de interven
- Page 54 and 55:
Maria Luísa Baptista4. DO ESPAÇO4
- Page 56 and 57:
Maria Luísa Baptista56Porto Novo,
- Page 58 and 59:
Maria Luísa Baptista58os elementos
- Page 60 and 61:
Maria Luísa Baptista60lhe mina o s
- Page 62 and 63:
Maria Luísa Baptista62Não encontr
- Page 64 and 65:
Maria Luísa Baptistacontribuem par
- Page 66 and 67:
Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 68 and 69:
Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 70 and 71:
Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 72 and 73:
Maria Luísa Baptista05.ANÁLISE DE
- Page 74 and 75:
Maria Luísa BaptistaO «combate»
- Page 76 and 77:
Maria Luísa Baptistaandro que, a d
- Page 78 and 79:
Maria Luísa Baptistaconsigna-se, p
- Page 80 and 81:
Maria Luísa Baptista80marido, uma
- Page 82 and 83:
Maria Luísa BaptistaO acentuar dos
- Page 84 and 85: Maria Luísa BaptistaO milharal, re
- Page 86 and 87: Maria Luísa Baptista86do «Romance
- Page 88 and 89: Maria Luísa Baptista88Como, pois,
- Page 90 and 91: Maria Luísa Baptista- a acção do
- Page 92 and 93: Maria Luísa Baptista92Sendo assim,
- Page 94 and 95: Maria Luísa BaptistaAfigura-se, po
- Page 96 and 97: Maria Luísa Baptista96ficos, mas a
- Page 98 and 99: Maria Luísa Baptista(pp. 24-28); e
- Page 100 and 101: Maria Luísa Baptistaa atmosfera es
- Page 102 and 103: Maria Luísa Baptistalíngua de fog
- Page 104 and 105: Maria Luísa Baptista104ção da su
- Page 106 and 107: Maria Luísa Baptistaquando a árvo
- Page 108 and 109: Maria Luísa Baptista108Actualizaç
- Page 110 and 111: Maria Luísa Baptista• «O posto
- Page 112 and 113: Maria Luísa Baptista112«Tem algum
- Page 114 and 115: Maria Luísa Baptista114Inerente à
- Page 116 and 117: Maria Luísa Baptista116Miguel Alve
- Page 118 and 119: Maria Luísa Baptista118Gente das p
- Page 120 and 121: Maria Luísa Baptista120a mão-de-o
- Page 122 and 123: Maria Luísa Baptistalos ventos cor
- Page 124 and 125: Maria Luísa Baptistadas a pique on
- Page 126 and 127: Maria Luísa Baptista• «A tarde
- Page 128 and 129: Maria Luísa Baptistasente embora,
- Page 130 and 131: Maria Luísa Baptista130directa. Ma
- Page 132 and 133: Maria Luísa Baptista«Fiz bem o qu
- Page 136 and 137: Maria Luísa Baptistatem-se os valo
- Page 138 and 139: Maria Luísa Baptistanada mais. Zep
- Page 140 and 141: Maria Luísa Baptista140Neste caso,
- Page 142 and 143: Maria Luísa Baptistaos homens. E,
- Page 144 and 145: Maria Luísa Baptista• a antevis
- Page 146 and 147: Maria Luísa Baptistase fosse para
- Page 148 and 149: Maria Luísa Baptista— Nem me lem
- Page 150 and 151: Maria Luísa Baptista- o «querer b
- Page 152 and 153: Maria Luísa Baptistacom bosques, c
- Page 154 and 155: Maria Luísa Baptista— Homem nasc
- Page 156 and 157: Maria Luísa BaptistaSupomos poder
- Page 158 and 159: Maria Luísa Baptistaágua que se s
- Page 160 and 161: Maria Luísa BaptistaO telurismo co
- Page 162 and 163: Maria Luísa Baptista• «Quem olh
- Page 164 and 165: Maria Luísa Baptistacimento da vul
- Page 166 and 167: Maria Luísa BaptistaAssim, em FVL
- Page 168 and 169: Maria Luísa Baptistadividual, de l
- Page 170 and 171: Maria Luísa Baptista• «Mas lá
- Page 172 and 173: Maria Luísa BaptistaTemos por form
- Page 174 and 175: Maria Luísa Baptista«Parece exact
- Page 176 and 177: Maria Luísa Baptistaa uma meia dú
- Page 178 and 179: Maria Luísa Baptistarelacionais (2
- Page 180 and 181: Maria Luísa Baptistapotencialidade
- Page 182 and 183: Maria Luísa Baptista«— Sempre e
- Page 184 and 185:
Maria Luísa Baptista184Um como out
- Page 186 and 187:
Maria Luísa BaptistaO «querer bip
- Page 188 and 189:
Maria Luísa Baptista• «Era o qu
- Page 190 and 191:
Maria Luísa BaptistaNa verdade, a
- Page 192 and 193:
Maria Luísa Baptistaa partilha do
- Page 194 and 195:
Maria Luísa Baptistalocando o home
- Page 196 and 197:
Maria Luísa Baptistados longes tra
- Page 198 and 199:
Maria Luísa Baptista(solidariedade
- Page 200 and 201:
Maria Luísa Baptistaproduções qu
- Page 203 and 204:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 205 and 206:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 207 and 208:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 209 and 210:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 211 and 212:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 213 and 214:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 215 and 216:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 217 and 218:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 219 and 220:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 221 and 222:
Vertentes da insularidade na novel