Maria Luísa Baptistaa atmosfera está saturada de humidade, e a hora H da precipitação éiminente, o nordeste varre tudo para o largo» (p. 26). É, entretanto, um«ventinho de feição para os navegantes» [...], um «vento bom para quemvai mar em fora e deixa para trás a sua Ilha!...» (p. 119). Comparativamentecom o seu opositor, é «o exército mais forte e menos generoso»(p. 27). Concebido outras vezes como um indivíduo, assume uma posturaleviana e boçal, de uma grosseria com laivos de animalesco: «O ventodescia às patadas distraídas, rebolava no terreiro; depois de dançaruns momentos com a papaeira, descia a chã, roçava as charuteiras docaminho e subia de novo para o alto.» (pp. 32-33). É temperamental,intempestivo: «Acontece que o nordeste acorda a tempo de não permitira formação de todo este cerimonial [o acastelar de nuvens, prenúncioda chuva], dispersa qualquer tentativa de agrupamento; indiferente aosseus benefícios, empurra para o Sul o exército líquido, que alija a preciosacarga no mar. Depois de furiosa e eficiente intervenção, de novo seausenta; [...]» (p. 26).Rival da monção húmida, contrapõe-se-lhe, numa «fúria danada»(p. 63); vingativo, exerce retaliações punitivas, brutais:• «[...] sob o chicote cortante do nordeste de Fevereiro, [...]» (p.100). «[...] sob o chicote do nordeste do Inverno.» (p. 118).• «O nordeste, de um momento para outro, varreu as nuvens emdirecção ao sul, e em poucas horas lançou as esperanças para lá dalinha do horizonte.» (p. 119).• «O vento cortante de Fevereiro soprava desalmadamente na noiteestrelada e fria.» (p. 152).100O nordeste consente que se enraize a dúvida e a esperança entre oshumanos; depois, antecipará e coadjuvará a acção letal da lestada.A lestada, a última das personagens «agentes», distingue-se pela absolutanegatividade dos seus traços caracterizadores. É associada a semassugestivos de calor excessivo: «lume» (p. 75), «fornalha» (p. 81),«ar fervente» (p. 97), «língua de fogo» (p. 97), «Inferno» (p. 93). Possuídade um belicismo de fera, «a lestada devorava» (p. 94), «uivando» (p.106). «Tamborilar» (p. 102), «esgrimir» (p. 102) remetem-nos tambémE-book CEAUP 2007
Vertentes da insularidade na novelística de Manuel Lopespara um cenario guerreiro. A lestada é «a implacável destruição das esperançasdos homens» (p. 94), a «desintegração irremediável» (p. 94),pois actua «exterminando sem piedade» (p. 97). Nas casas, os própriosmóveis «gemiam sob o látego do suão» (p. 107).É ainda o «vento maligno» (p. 117) a «moléstia» (p.75) portadorade moléstias de vária ordem: «Quando vem lestada, chuva não vem,»(p. 75); «o suão sufocava.» (p. 83); «Este suão põe-me a boca às feridas.Sufoca-me. Sinto a pele a arder...» (p. 88); «Meu Deus, este suão mata--me» (p. 91); «Meu Deus, este vento sufoca, rasga-me a pele como umaporção de facas finas. Que horror de tempo!...» (p. 92). Socialmente,com a fome surgem os primeiros assaltos e o despovoamento das pastagens,porque os donos dos rebanhos os mandam recolher para evitaremmaiores prejuízos. Inerente, o desemprego implícito e o agravamentoda marginalidade.A sensualidade, por fim, poderia ser um traço antropomórfico positivo,se não se afirmasse pela rudez desajeitada: «Maria Alice correu paradentro, sufocada. O vento redemoinhava no terreiro, dançava junto daporta e entrava, perseguindo-a. Atirava-se a ela, picava-lhe a epidermecomo mãos ásperas e febricitantes de homem loucamente apaixonado.Deixou-se ficar, tonta, a um canto, com a impressão de que vertia sanguede mil pequenas chagas.» (p. 92).Verifica-se que o Autor recorre ao artifício discursivo da comparaçãomais frequentemente do que na apresentação dos dois outros ventos: defeições extremas, revelar-se-á decerto insuficiente o meio linguístico decaracterização directa, a adjectivação. Além dos recursos citados, queexemplificaremos de seguida, o Autor utiliza sobretudo, como nos casosdo nordeste e da monção húmida, a referência aos efeitos da acção— neste particular só nefasta — da lestada. E ocorrem utilizações mistasdos recursos referidos.Alguns casos de caracterização por adjectivação: «vento ruim» (p. 75),«vento ardente» (p. 93), «uma lufada de ar fervente» (p. 97), «vento maligno»(p. 117).Alguns casos de caracterização por comparação: «um vento que parecelume» (p. 75), «vento ruim como moléstia» (p. 75), «[...] como sefosse obra do diabo» (p. 75), «parece uma fornalha» (p. 81), «como uma1012007 E-BOOK CEAUP
- Page 5 and 6:
VERTENTES DA INSULARIDADE NANOVELÍ
- Page 7 and 8:
ÍNDICEApresentação 9Nota prévi
- Page 9:
Concorri ao Mestrado de Literaturas
- Page 12 and 13:
Maria Luísa BaptistaNOTA PRÉVIAPa
- Page 14 and 15:
Maria Luísa Baptista14go, pude con
- Page 16 and 17:
Maria Luísa Baptista02.MANUEL LOPE
- Page 18 and 19:
Maria Luísa Baptista18seus número
- Page 20 and 21:
Maria Luísa Baptistapara os meteor
- Page 22 and 23:
Maria Luísa Baptistae sofrendo um
- Page 24 and 25:
Maria Luísa Baptista24para a franc
- Page 26 and 27:
Maria Luísa Baptista26A relativa p
- Page 28 and 29:
Maria Luísa Baptistade contextuali
- Page 30 and 31:
Maria Luísa Baptista1. DA ACÇÃO3
- Page 32 and 33:
Maria Luísa Baptistamo entre quere
- Page 34 and 35:
Maria Luísa Baptista34A partir da
- Page 36 and 37:
Maria Luísa Baptista36títulos apo
- Page 38 and 39:
Maria Luísa Baptistaremos a afirma
- Page 40 and 41:
Maria Luísa Baptista40Notemos que
- Page 42 and 43:
Maria Luísa Baptistasilenciaram. C
- Page 44 and 45:
Maria Luísa Baptista44distintivos
- Page 46 and 47:
Maria Luísa Baptista46insuficiente
- Page 48 and 49:
Maria Luísa Baptista48(CB, p. 57).
- Page 50 and 51: Maria Luísa BaptistaA despeito dis
- Page 52 and 53: Maria Luísa Baptista52de interven
- Page 54 and 55: Maria Luísa Baptista4. DO ESPAÇO4
- Page 56 and 57: Maria Luísa Baptista56Porto Novo,
- Page 58 and 59: Maria Luísa Baptista58os elementos
- Page 60 and 61: Maria Luísa Baptista60lhe mina o s
- Page 62 and 63: Maria Luísa Baptista62Não encontr
- Page 64 and 65: Maria Luísa Baptistacontribuem par
- Page 66 and 67: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 68 and 69: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 70 and 71: Maria Luísa BaptistaAcontecimentos
- Page 72 and 73: Maria Luísa Baptista05.ANÁLISE DE
- Page 74 and 75: Maria Luísa BaptistaO «combate»
- Page 76 and 77: Maria Luísa Baptistaandro que, a d
- Page 78 and 79: Maria Luísa Baptistaconsigna-se, p
- Page 80 and 81: Maria Luísa Baptista80marido, uma
- Page 82 and 83: Maria Luísa BaptistaO acentuar dos
- Page 84 and 85: Maria Luísa BaptistaO milharal, re
- Page 86 and 87: Maria Luísa Baptista86do «Romance
- Page 88 and 89: Maria Luísa Baptista88Como, pois,
- Page 90 and 91: Maria Luísa Baptista- a acção do
- Page 92 and 93: Maria Luísa Baptista92Sendo assim,
- Page 94 and 95: Maria Luísa BaptistaAfigura-se, po
- Page 96 and 97: Maria Luísa Baptista96ficos, mas a
- Page 98 and 99: Maria Luísa Baptista(pp. 24-28); e
- Page 102 and 103: Maria Luísa Baptistalíngua de fog
- Page 104 and 105: Maria Luísa Baptista104ção da su
- Page 106 and 107: Maria Luísa Baptistaquando a árvo
- Page 108 and 109: Maria Luísa Baptista108Actualizaç
- Page 110 and 111: Maria Luísa Baptista• «O posto
- Page 112 and 113: Maria Luísa Baptista112«Tem algum
- Page 114 and 115: Maria Luísa Baptista114Inerente à
- Page 116 and 117: Maria Luísa Baptista116Miguel Alve
- Page 118 and 119: Maria Luísa Baptista118Gente das p
- Page 120 and 121: Maria Luísa Baptista120a mão-de-o
- Page 122 and 123: Maria Luísa Baptistalos ventos cor
- Page 124 and 125: Maria Luísa Baptistadas a pique on
- Page 126 and 127: Maria Luísa Baptista• «A tarde
- Page 128 and 129: Maria Luísa Baptistasente embora,
- Page 130 and 131: Maria Luísa Baptista130directa. Ma
- Page 132 and 133: Maria Luísa Baptista«Fiz bem o qu
- Page 134 and 135: Maria Luísa Baptistata-se devidame
- Page 136 and 137: Maria Luísa Baptistatem-se os valo
- Page 138 and 139: Maria Luísa Baptistanada mais. Zep
- Page 140 and 141: Maria Luísa Baptista140Neste caso,
- Page 142 and 143: Maria Luísa Baptistaos homens. E,
- Page 144 and 145: Maria Luísa Baptista• a antevis
- Page 146 and 147: Maria Luísa Baptistase fosse para
- Page 148 and 149: Maria Luísa Baptista— Nem me lem
- Page 150 and 151:
Maria Luísa Baptista- o «querer b
- Page 152 and 153:
Maria Luísa Baptistacom bosques, c
- Page 154 and 155:
Maria Luísa Baptista— Homem nasc
- Page 156 and 157:
Maria Luísa BaptistaSupomos poder
- Page 158 and 159:
Maria Luísa Baptistaágua que se s
- Page 160 and 161:
Maria Luísa BaptistaO telurismo co
- Page 162 and 163:
Maria Luísa Baptista• «Quem olh
- Page 164 and 165:
Maria Luísa Baptistacimento da vul
- Page 166 and 167:
Maria Luísa BaptistaAssim, em FVL
- Page 168 and 169:
Maria Luísa Baptistadividual, de l
- Page 170 and 171:
Maria Luísa Baptista• «Mas lá
- Page 172 and 173:
Maria Luísa BaptistaTemos por form
- Page 174 and 175:
Maria Luísa Baptista«Parece exact
- Page 176 and 177:
Maria Luísa Baptistaa uma meia dú
- Page 178 and 179:
Maria Luísa Baptistarelacionais (2
- Page 180 and 181:
Maria Luísa Baptistapotencialidade
- Page 182 and 183:
Maria Luísa Baptista«— Sempre e
- Page 184 and 185:
Maria Luísa Baptista184Um como out
- Page 186 and 187:
Maria Luísa BaptistaO «querer bip
- Page 188 and 189:
Maria Luísa Baptista• «Era o qu
- Page 190 and 191:
Maria Luísa BaptistaNa verdade, a
- Page 192 and 193:
Maria Luísa Baptistaa partilha do
- Page 194 and 195:
Maria Luísa Baptistalocando o home
- Page 196 and 197:
Maria Luísa Baptistados longes tra
- Page 198 and 199:
Maria Luísa Baptista(solidariedade
- Page 200 and 201:
Maria Luísa Baptistaproduções qu
- Page 203 and 204:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 205 and 206:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 207 and 208:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 209 and 210:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 211 and 212:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 213 and 214:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 215 and 216:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 217 and 218:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 219 and 220:
Vertentes da insularidade na novel
- Page 221 and 222:
Vertentes da insularidade na novel