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Relações Familiares e Homoafetividade (*Palestra ... - Anadep

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Relações <strong>Familiares</strong> e <strong>Homoafetividade</strong> (<strong>*Palestra</strong>proferida no III Congresso Nacional de DireitoHomoafetivo)Por Carlos Eduardo Rios do Amaral - Titular do NúcleoEspecializado de Promoção e Defesa dos DireitosIndividuais e Coletivos da Mulher da Comarca de Vitória eda Defensoria Pública do Estado do Espírito SantoCabe a mim neste III Congresso Nacional de DireitoHomoafetivo discorrer acerca do tema Relações<strong>Familiares</strong> e <strong>Homoafetividade</strong>, no contexto da LeiMaria da Penha.Pois bem. Desde logo, faço uma advertência. A LeiMaria da Penha só tem aplicabilidade quando a vítima,no ambiente doméstico ou familiar, seja do sexofeminino, ou seja, mulher. Mulher, quero dizer, aquelaque possui em seu registro civil o sexo feminino, sejaem razão da alteração deste registro, sejaoriginariamente.Importante ressaltar que aqui não houve um propositalcochilo ou rejeição do legislador à tutela dos


homossexuais do sexo masculino. Os homensheterossexuais também estão fora do âmbito deproteção da Lei Maria da Penha.Explico. O texto constitucional é claro ao dizer: “OEstado assegurará a assistência à família na pessoa decada um dos que a integram, criando mecanismos paracoibir a violência no âmbito de suas relações”.Como podem observar, é na pessoa de cada um,homem ou mulher, independentemente da orientaçãosexual, que o Estado deve criar mecanismos legais paracoibir a violência familiar. E não apenas de um únicosexo.Estou longe de querer dizer que a Lei Maria da Penhaseria um diploma inconstitucional ou infrutuoso. A LeiMaria da Penha vem fazendo a sua parte na proteção edefesa das mulheres no País. Mas, ainda é insuficientepara proteger a todos no âmbito doméstico ou familiar.A Constituição Federal de 1988 não nega amparo aoshomens em suas relações familiares,independentemente da orientação sexual, quandovítimas de qualquer tipo de violência. A legislaçãoinfraconstitucional, sim. E algo deve ser feito.


No entanto, é fácil explicar a predileção do legisladorpela tutela legislativa solitária da mulher. A Lei Mariada Penha foi precedida de duas grandes convençõesinternacionais feministas, a CONVENÇÃO SOBRE AELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DEDISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER dasNações Unidas, de 1979, a famosa CEDAW, e aCONVENÇÃO INTERAMERICANA PARAPREVENIR, PUNIR E ERRADICAR AVIOLÊNCIA CONTRA A MULHER –“CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ” da OEA,de 1994. Logo depois, em 2001, sobreveio a pública enotória condenação do Brasil na ComissãoInteramericana de Direitos Humanos, no caso Mariada Penha Maia Fernandes.Assim, pressionado pela comunidade internacional, oCongresso Nacional brasileiro houve por bem atenderaos anseios universais de criar mecanismos para coibira violência doméstica e familiar contra a mulher.Assim, destaco aos presentes a importância damilitância de organismos internacionais, assim comode sociedades e organizações governamentais e nãogovernamentais,que atuem aqui e no exterior, parapressionar o Parlamento brasileiro a acelerar a


elaboração de leis que prestigiem o fim da homofobiano Brasil, garantindo-se, assim, indistintamente a todosos brasileiros o gozo dos direitos humanosfundamentais, civis e políticos.A Lei Maria da Penha é, sim, fruto dodescompromisso, da indiferença e do desprezo daRepública brasileira e de sua sociedade ao respeito àigualdade entre homens e mulheres.Reitero, aqui, a importância dos mecanismosinternacionais – tratados, convenções e resoluçõesinternacionais – para pressionar o Brasil quanto àelaboração de leis que cessem todo e qualquer tipo dediscriminação, intolerância ou negligencia contra aprevalência e efetividade dos direitos humanos doshomossexuais.A Organização das Nações Unidas e a Organizaçãodos Estados Americanos são entidades que, mais doque reunir diversos Países-Membros, fundamentam-seno respeito aos direitos humanos universais,abandonando opções políticas casuístas, de ortodoxiareligiosa e de preconceitos peculiares de Nações aindaem desenvolvimento.


Talvez este seja um caminho distante, de horizontesdesconhecidos. Mas esse sempre foi o caminho da lutapelos direitos dos homossexuais. Para os homossexuaisnada é ou foi fácil, tudo é mais difícil. Esta seria maisoutra cruzada, que não pode e não deve serdesconsiderada pelos apaixonados pela batalha daliberdade de opção sexual.Voltando à Lei Maria da Penha propriamente dita,esclareço que ao contrário do que muitos pensam, eaqui tal esclarecimento tem a sua relevância, nãoapenas o cônjuge ou companheiro pode figurar comosujeito ativo, o agressor, do episódio de violênciadoméstica.A partir da decisão do CNJ sedimentando econsolidando o casamento civil entre homossexuais,podemos antever uma série de conflitos e contendas noplano fático que poderão ocorrer, deflagrando acompetência da Lei Maria da Penha.Volto a explicar, a Lei Maria da Penha só temaplicabilidade quando a vítima, no ambiente domésticoou familiar, seja do sexo feminino, ou seja, mulher.Mulher, repito, aquela que possui em seu registro civil


o sexo feminino, seja em razão da alteração desteregistro, seja através do registro originário.E quem seriam os potenciais agressores desta vítimamulher homossexual, para efeito de aplicabilidade daLei Maria da Penha? A resposta, a partir da aplaudidadecisão do CNJ, é fácil. Todo e qualquer familiar dacompanheira e a própria.Assim, os avós, pai e mãe, padrastos e madrastas,irmãos e irmãs, filhos e filhas, netos e netas dacompanheira, mesmo do sexo feminino aqueles,poderão, sim, figurar como agressoras na Lei Maria daPenha. O sexo feminino, claro, pode figurar comoagressor na Lei Maria da Penha.Um detalhe curioso, a esposa ou companheirahomossexual poderá até ser falecida, para efeito deaplicabilidade da Lei Maria da Penha, contra osfamiliares e parentes da esposa ou companheira morta.Todos devem ter em mente que a Lei Maria da Penha,através de suas temidas Medidas Protetivas deUrgência nominadas e inominadas, cria uma infinitasérie de provimentos judiciais de cunho cível,patrimonial ou de direito de família que, por vezes,


acabam resguardando de modo satisfativo e exaurienteo direito violado.Vejamos alguns exemplos, de modo ligeiro.A vítima mulher poderá solicitar que algum familiar ouparente de sua companheira, ou a própria, tenha contrasi a suspensão da posse ou restrição do porte de armas,com comunicação ao órgão competente. Aqui,dispensa-se qualquer comentário, em razão do caráterletal do objeto.A vítima mulher poderá solicitar contra algum familiarou parente de sua companheira, ou a própria, oafastamento do lar, domicílio ou local de convivência.Nos casos em que a coabitação ou permanência doagressor ou agressora se traduza como prorrogação deseu sofrimento doméstico, físico ou psicológico.Poderá também a vítima mulher homossexual requerer,contra os familiares ou parentes da companheira, oucontra a própria, que sejam proibidos: de se aproximar,fixando-se um limite mínimo de distância; de mantercontato por qualquer meio de comunicação; defreqüentar determinados lugares a fim de preservar aintegridade física e psicológica da ofendida, como seu


local de trabalho, creche ou escola de dependentesmenores.A vítima mulher homossexual poderá requerer contradeterminados familiares de sua companheira ou contraa própria a restrição ou suspensão de visitas aosdependentes menores. A Lei Maria da Penha não fazreferência ao “filho”, mas, sim, a dependentes menores,expressão mais ampla, que poderá, inclusive, abrangero próprio filho da companheira, oriundo de outrarelação heterossexual, mas que conviva sob suadependência e afeto, estando a mãe biológica viva ounão. Essa medida será cabível também nos casos dealienação parental, leia-se, homofobia, perpetrada pelosfamiliares da companheira. Ou mesmo nos casos defalecimento da companheira, quando haja disputa pelaguarda do menor, quando familiares da falecidaestejam praticando toda a sorte de violência, comoinjúrias, ameaças, perseguições etc, seja movidos pelahomofobia ou não.Caberá à companheira, se necessitar, a prestação dealimentos provisionais ou provisórios, nos casos deviolência doméstica, contra a sua consorte. Aqui nãohá a responsabilidade complementar dos pais dacompanheira, existente apenas nas Varas de Família,em razão da pessoalidade e intranscendência da


esponsabilidade penal. A não ser que os sogrosintegrem a relação processual no Juizado de ViolênciaDoméstica.A companheira ofendida poderá ter a sua recondução,e a dos respectivos dependentes, ao seu lar, uma vezexpulsa ilegal ou injustamente pelos familiares ouparentes da esposa ou convivente, ou pela própria.Notadamente nos casos de discussão de direitos reaisimobiliários, possessórios ou hereditários. Sabe-se queagora com as decisões do STF e do CNJ a mulherhomossexual, dependendo do caso, ou será herdeira oumeeira, ou terá o direito real de habitação, nos casos defalecimento de sua companheira, assim como acontececom as viúvas heterossexuais.A ofendida poderá ter garantido o seu afastamento dolar, através de decisão judicial, se assim desejar,preservando-se seus direitos relativos a bens, guardados filhos e alimentos. Para que os familiares de suacompanheira ou esposa, ou a própria, não aleguem emjuízo o revogado abandono do lar, prescrição aquisitivapela usucapião, ou qualquer outro proveitopatrimonial, moral ou econômico decorrente desta suasaída do cativeiro doméstico. Há casos em que nãosuportando a humilhação a companheira bate-se emretirada. Agora, sairá amparada pela Lei.


A companheira poderá requerer a separação de corpos,para cessar os deveres de fidelidade e colaboraçãomútua. Mais do que natural que após uma sessão deameaças, espancamentos e xingamentos, há anos a fio,todo e qualquer ser humano queria estar nos braços dequem a ame e a respeite. Sem que isso sugira ou insinueadultério ou qualquer rótulo de promiscuidade(venerada por homofóbicos).Para finalizar, trago um dos pontos mais importantes,que serão acionados com a consolidação do casamentocivil homossexual no Brasil. O casamento civil ou aunião estável entre homossexuais, com as suasconsequências patrimoniais, certamente farão surgirgrandes e acaloradas discussões a respeito de pensãopor morte previdenciária, administração de pensão defilho menor, divisão de bens da relação, partilha deacervo hereditário e outras situações que poderão fazerdespontar a companheira homossexual como vítima naLei Maria da Penha, frente à ganância e violência deseus afins.E para a proteção patrimonial dos bens da sociedadeconjugal, da união estável ou daqueles de propriedadeparticular da mulher, a Lei Maria da Penha poderádeterminar contra os familiares da companheira ou


contra a própria: a) restituição de bens indevidamentesubtraídos à ofendida; b) proibição temporária para acelebração de atos e contratos de compra, venda elocação de propriedades, oficiando-se ao Cartório; c)suspensão de procurações, oficiando-se ao Cartório; e,d) prestação de caução provisória, mediante depósitojudicial, por perdas e danos materiais decorrentes daprática de violência doméstica e familiar contra aofendida.Em todo o caso, a DEFENSORIA PÚBLICA DOESTADO DO ESPÍRITO SANTO, pelo seuNÚCLEO ESPECIALIZADO DE PROMOÇÃO EDEFESA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS ECOLETIVOS DA MULHER – NUDEM, serásentinela incansável para a preservação dos direitoshumanos das mulheres homossexuais, contra todo equalquer tipo de violência, crueldade ou opressãopraticados no âmbito da unidade doméstica, da famíliae em qualquer relação íntima de afeto.Muito Obrigado!__________________________


Por Carlos Eduardo Rios do Amaral - Titular doNúcleo Especializado de Promoção e Defesa dosDireitos Individuais e Coletivos da Mulher daComarca de Vitória e da Defensoria Pública doEstado do Espírito Santo

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