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seleção de textos, fotos, quadrinhos e repressão - Memórias ...

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i/ .Autocrítica da censura:Não se esmaga a verdadecomo um inseto"Pouca gente neste país tem adimensão exata do que significacensura aos meios de comunicação.Vivemos dois períodos particularmentenegros: o primeiro no governode Vargas (1930-45, com destaquepara o Estado Novo, 1937-45). Naépoca de Vargas pontificava umorganismo denominado Departamentode Imprensa e Propaganda -DIP -, que cristalizou o processo decerceamento da liberdade deexpressão. É sobre ele que publicamosdepoimentos de dois antigosfuncionários - Álvaro Vieira e SampaioMitke - a Domingos Meireles.Apesar de cometerem erros deinformação e não ajudarem muito areconstituir o funcionamento complexamenteburocrático, ou mesmodelinear a função de organismo demobilização nacional que o DIPteve, os depoimentos valem porserem os primeiros que ex-funcionáriosdão a jornais. É possível quemuitos jornalistas brasileiros deagora, ao lerem estas declarações,conscientizem-se de que, daqui aalguns anos, poderão estar na cadeirade Vieira e Mitke. E é até possívelque outros leitores percebam quecensura é a arma mais branda de umregime para cercear a liberdade,exercida, basicamente, sobre jornaisque ás vezes destoam, mas jamaisabandonam o coro que eles própriosajudaram a formar, os que nãoentram no coro perdem a voz, ou aspáginas. Os depoimentos forampublicados no número 23 do jornalda Associação Brasileira de Imprensa,uma entidade que recebeu muitosempréstimos de Vargas e favoresdo DIP. (Sérgio Buarque)."Não adianta esconder ou dissimular arealidade dos fatos. Ela é como determinadosagentes microbianos que denunciama face da doença que se procuraencobrir. No Estado Novo, a Censuraempenhava-se em negar sempre, comveemência, que as instituições democráticasestavam enfermas. Ocultavam-se ossintomas, com medidas coercitivas, masas chagas iam aos poucos se alastrandopor toao o organismo social. Até mesmoo leigo, com o correr do tempo, já eracapaz de diagnosticar o mal diante dasmutilações provocadas pela própriadoença."A voz pausada, temperada com levesotaque mineiro, vai dissecando, com afirmeza de um bisturi, o órgão que tevecomo berço uma sala apertada e mal iluminada,no quarto andar da Chefaturade Polícia do Distrito Federal, e quedepois cresceu, em acomodações maisespaçosas, ao se instalar nos salões doPalácio Tiradentes, onde passou a funcionarcom o fechamento ao CongressoNacional.No apartamento acanhado de quartoe sala, em Botafogo, o médico e jornalistaaposentado Álvaro Vieira confesa,com uma ponta de remorso, que atéhoje não conseguiu se libertar do fardoque carrega, com resignação, por haverservido à Censura, nos primeiros anos daditadura getulista.Vieira corre os dedos pelos cabelosinvadidos por fios brancos; a testa larga,vincada, acentua ainda mais o constrangimentoque o domina sempre que seuspensamentos são assaltados por velhasreminiscências do tempo em que freqüentavao prédio cinzento da rua daRelação.A chefia de Polícia, naquela época, eraexercida ^pelo ex-deputado BatistaLuzardo, que, após a vitoria da revoluçãode 1930, nomeou Salgado Filho para a 4*.Delegacia Especializada a fim de que,com a perseverança de um missionário,se empenhasse na organização de um"serviço de censura . As confessadasambições políticas de Salgado Filhoimpediram a implantação de uma censuraprévia a fim de conquistar a simpatiados donos dos jornais. A censura, portanto,seria posterior e aqueles que nãoacatassem as suas determinações teriamas edições apreendidas: Naquela época,o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda)era ainda uma sigla inocente,quase sem expressão política. A sua sombrasó iria erguer-se, alguns anos depois,com o Estado Novo, quando chegariaameaçadora, às redações de todo o País.Seus funcionários dedicavam-se atéentão a obrigar donos de bares, restaurantese mercearias a exibirem o retratode Getúlio Vargas enfiado em um fraquede tropical inglês, com a faixa presidencialatravessada no peito."Salgado Filho escolheu quatro jornalistaspara auxiliá-lo na organização dacensura. Um deles entrou há alguns anospara a Academia Brasileira de Letras. Osluatro ficaram como assessores diretoslo Salgado e cada um, depois, ;pc criou seuproprio "staff' Cerca de 2' 20 ou 30 jornalistasforam contratados i pe >ela 4*. Delega-cia como censores. O salário era de tre-zentos réis. Eu era estudante deMedicina, trabalhava como redator em"A Batalha", o que eu ganhava era umamiséria. Um amigo influente recomendou-meao Salgado Filho. Ao ser informadodo trabalho que me haviam reservado,declinei do convite, mas os companheirosque já haviam sido contratadosinsistiram para que eu ficasse. Utilizaramum argumento que, naquela época,me convenveu: era melhor que acensura fosse exercida por jornalistas doaue por policiais. Fiquei então trabalhandosob a orientação de Ribamar CasteloBranco. Funcionava como umaespécie de "contato" entre a Censura e adireção de três jornais: O Globo,Correio da Manhã e Diário de Notícias.Se alguma notícia proibida fosse publicada,eu procurava o diretor responsávele lhe transmitia as ameaças e apreensõesdo Salgado Filho. A censura a posterioridesses jornais era feita diariamente pormim."As rotativas dos jornais mal começavama se espreguiçar e um motociclistada polícia já estava plantado na oficinapara recolher a primeira fornada deexernplares, na boca da máquina, a fimde que o noticiário fosse examinadopelos censores, na 4 ? . Delegacia, antesde chegar às mãos do leitor.

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