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seleção de textos, fotos, quadrinhos e repressão - Memórias ...

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"Fui negligente com a ultimavitima. Queimei sua bolsa pelametade, talvez já estivessecansado desta missão superior.agora, que chegou a minha hora demorrer, e eu aceito seu julgamento divino.Estou cansado, além do mais. Li muitoe muito escrevi, e tenho pressa dechegar ao fim dessas memórias. Souobrigado, para continuar a escrever, acolocar os óculos dourados que pertenceramao doutor Henderson minha sextavítima. Mas vamos à sra. Olive Durand-Deacon, a última pessoa nesta terra dequem bebi um copo de sangue.- Ela era, quando a encontrei, "umamulher no crepúsculo da vida", parausar os termos ao procurador-geral emmeu processo. Devo dizer que, com ela,fui negligente. Não que seja o meu natural.Agrada-me repetir que gosto mais deuma injustiça do que de uma desordem.Mas eu me senti a tão protegido pela forçasuperior, que me esqueci das precauçõesmais elementáres. A sra. Durand-Deacon morava na mesma pensão familiarque eu, em Kensington. Agradei-afalando-lhe de música, arte, literatura.Tivemos também conversas filosóficas ereligiosas. Ela via em mi,m, apesar dosmeus 40 anos, "um jovem homem quetem tudo o que se pode desejar".No processo, o público ficou excitadocom o motivo engraçado que a levou ameu apartamento. A velha senhorasofria por não ter mais unhas, e eu lhedisse que poderia tazer-lhe outras deplástico' , em minha oficina. Foi assim queela partiu'pa ra sua ú Itima viagem, a 18 de fevereirode 1949. Matei-a com uma bala nanuca. Fiz um corte em seu pescoço ebebi um copo de sangue. Ela trazia umacruz amarrada ao pescoço. Senti umaalegria infinita em esfregar a cruz.Ja disse que fui negligente com a sra,Durand-Deacon. Queimei sua bolsapela metade; não dissolvi completamenteo corpo.Certo, agi mal. Mas imaginemque eu precisava introduzir um corpo de90 quilos num barril. Não é suficientepara explicar a negligência. Talvez euestivesse simplesmente cansado dematar, e desta missão confiada peladivindade superior, e quem sabe ansiosopara acabar com ela e encontrar orepouso, mesmo que fosse na asquerosacela de terra reservada aos condenados àmorte. Cansado de carregar o corpo davelha senhora, saí para tomar um chá.Quando voltei, vi que tinha deixado aporta aberta. Qualquer pessoa poderiater entrado, ter visto o cadáver. Matei-anuma sexta. No domingo, estava na casade amigos. Uma jòvem me disse derepente:- Não me olhe desse jeito.Desviei o olhar, mas continuei a vê-laem pensamento. Ela então disse: .- Sinto que você continua me ofhando.E gritou:- Assassino!Este poder de adivinhação me pareceuincompreensível. Logo, os policiais queinvestigaram o desaparecimento da sra.Durand-Deacon descobriram em minhacasa os restos de seu corpo e de suas coisas.Agora que termioou, queria dizeralgumas xõisas. Uma de minhas últimasrecordações vai para Pat, o cão dos Henderson.Foi um grande companheiropara mim, e estou feliz de ter podidofazer algo por ele.É uma pequena vaidade,mas pode-seadmitir isto num homem que está prestesa morrer: gostaria que as roupas queeu vestia no dia do julgamento fossemenviadas ao museu de cera de madameTrussaud, para que vistam minha efígie.Desejo que o conservador do MuseuTrussaud cuidè para que minhas calçastenham sempre um vinco impecável.Engordei na prisão: é desagradável.Espero que, para minha efígie, conservem-meuma linha mais esbelta.Existe ainda uma revelação engraçada.Fiz minhas experiências com ácidos naprisão, quando estive condenado porfalsificaçoão. Eu trabalhava na oficina.Combinava com ós.prisioneiros que trabalhavamno campo, e-eles me traziamratos. Ficava horas observàndo a lentadecomposição dos ratos no ácido. Ratose homens...como diz a Escritura.Da porta de minha cela, sei que 15 pessoasme separam do cadafalso. É poucopara transpor a eternidade. Chove hoie.Vejo a chuva bater no alto dos telhadosque vislumbro por cima do muro da prisão.Ela me transmite o mesmo desejoque senti várias vezes, sob o arvoredo deuma magnífica floresta, quando solitárioprocurava um objetivo que, quem sabe,não existe mais. Penso nestas linhasescritas por um grande homem da antigüidade,não sei mais quem foi: "Nãoantes que as profissões sejam paralisadase que as lançadeiras cessem de correr,Deus não desenrolará o quadrorevelará o porquê".nemNasci a 24 de julho de 1909, em Stanford,Lincolnshire. Meuspais estavam namiséria. Meu pai tinha 38 anos; minhamãe, 40. Meu pai era contramestre eletricista,mas nao tinha trabalho. Minhamãe estátcerta de que os meses de sofrimentosque precederam meu nascimentosão a causa daquilo que ela chama deminha doença mental. "A culpa éminha", disse ela, "por que não compareçodiante dos juizes ao lado de meufilho? sou tão responsável quanto ele!"Meu pai era o chefe de uma comunidadereligiosa. Eles me educaram numclima inumano, pior que num mosteiro.Sobre a fronte de meu pai há uma cicatriz,uma espécie de cruz deformada. Eleme explicava que era a marca de Satã. Eletinha pecado, e o Diabo tinha punido.- Se você comete uma falta, Satã omarcará do mesmo jeito.Durante anos, olhei a fronte das pessoas,para ver se tinham a marca. E achavaque meu pai era o único a ter pecado,e que o resto era inocente. À noite, faziameu exame de consciência. Ia instintivamentepara perto de um espelho, paraver se a marca tinha aparecido em minhafronte.Fui à escola só até os 17 anos. Fazia partedo coral na igreja. Domingo, levantavaàs 5 horas para assistir à missa. Ficava na>igreja o dia todo, até a missa da noite.Voltando, encontrava meus pais rezando,e me ajoelhava junto deles. Asjovens da minha idade não gostavam demim. No entanto, eu estava semprepronto para ajudar o próximo. Adoravaos animais. Dava minna própria comidaaos cães vadios. Amava também os coelhose as aves selvagens.Em 1927, com 18 anos, acreditava quetinha uma grande missão a cumprir entreos homens. Comecei a pregar; e descobriesta coisa maravilhosa: eu tinha odom da palavra. A multidão de fiéis meouvia palpitante e lágrimas corriamsobre os rostos. Meus pais ficaram orgulhosos.E era eu, aquele jovem apóstoloapaixonado pela pureza, quem seencontrava, apenas alguns anos mais tarde,na prisão de Leeds, condenado porfraude. O que passou? Primeiro, eramminhas mãos, minhas alvas mãos de artista.Toda minha vida eu as adorei, comuma espécie de fetichismo que não possoexplicar a mim mesmo. Na prisão,sofro por não ter sabão e água quente,para limpá-las várias vezes por dia.Trabalhei um ano numa fábrica demotores, depois um ano num escritório,aí um ano na companhia Shell. Cheguei,assim, á maioridade e decidi trabalharpor minha conta. Montei uma empresaae ceguros e publicidade; em 1933,montei outra empresa, de anúnciosluminosos. Tudo isso deu muito trabalhoe pouco lucro. Compreendi, então, quea honestidade não dá lucro. Foi em 1934que dei o passo decisivo.Percebi que o sistema de venda e aluguelde automóveis era mal organizadoe podia permitir falcatruas fáceis. Entreinuma sociedade dessas. No mesmo ano,em julho, casei com uma jovem de 21anos. Beatrice Hamer. Desposei-a paradeixar meus pais. Não podia mais ficarcom eles e seus princípios religiosos,agora que tinha escolhido a vida desonesta.Mas minha felicidade conjugai foicurta. Em novembro, fui posto na cadeia.Tinha vendido automóveis que não existiam.Minha mulher decidiu nunca maisme ver. Durante meus dias naprisão, deuà luz uma menina, que foi adotada pordesconhecidos. Existe hoje uma jovemde 14 anos, que ignora que seu verdadeiropai sou eu, John Haigh, aquele quechamam de Vampiro de Londres.Saí da prisão em novembro de 1933 evoltei para a casa de meus pais, que meperdoaram. Meu empreendimentoseguinte valeu 4 anos de prisão. Escolhi onome de um advogado ao acaso, e abriem seu nome um escritório em outracidade. Vendi aos clientes ações que nãoexistiam. A Grã-Bretanha estava emguerra, quando me vi em liberdadeoutra vez. Procurei emprego na DefesaPassiva. E forma os horrores dos grandesbombardeiros sobre a Inglaterra que mefizeram abandonar a idéia de um Deusjusto.Estava um dia com uma enfermeira daCruz Vermelha num posto de guarda,quando ouvi as sirenas. Saímos para nossospostos. De repente, escutei um silvoterrível e me atirei sob um portão. Abomba explodiu com um estrondo doApocalipse. Quando levantei, machucado,uma cabeça rolou a meus pés. Era ade minha companheira de todos osmomentos, que era tão alegre, tão bonita.Como Deus permitiu esse horror?Agora, não creio mais em Deus, masnuma Força Superior que nos empurra aagir e rege misteriosamente nosso destino,sem se preocupar com Bem ou Mal.Contei como ela meempurrou a degolaros seres humanos. E foi a niim, que amo eadoro a menor, a mais frágil das criaturas,que Ele ordenou cometer essas mortese beber o sangue humano. Isso não épossível: meus 9 mortos precisam ter suaexplicação em algum lugar deste mundo.Não é possível que sejam absurdamenteapenas o sonho de um loucocheio de brutalidade e furor, como disseo grande Shakespeare.Existe uma vida eterna? Logo maissaberei. Esperando, adeus...Enforcado ontem o" Vampiro de Londres"IjONDBES, 10 (AFF) —Sem 6menor Incidente, John Georg«Haigh assassino da viuva DurandDeacon e, provavelmente, de oitooutras pessoas, foi enforcado boje.ás nove horas, no patlbulo da prts&Ode Wandsworth.Após uma Instrução sensacional»um Inquérito no qual Interveio to»da a policia da Inglaterra e ug»processo sem Imprevistos, seguidode m» Inevitável condenação émorte, veio encerrar este estranhpeplsodio da historia criminal daGrã-Bretanha.

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